Agradeço, inclusive, pela oportunidade de falar com a voz de outros quadrantes de Mato Grosso. É preciso representar a atual representatividade espelhada nesta Casa de Letras que impacta vários segmentos sociais em sua autoestima e identidade. Com Sueli Batista que sai da presidência e Luciene Carvalho, que assume a administração, nossa Academia de Letras estimula a aceitação e a legitimação da diversidade.
O que a gestão Sueli Batista representou para a Casa Barão de Melgaço? Basicamente uma conexão com segmentos diversos sociedade mato-grossense, alargando o diálogo, já aberto em gestões anteriores. Essa é a tarefa que Luciene continua e aprofunda: o encontro com o outro, muitos outros. Eis o humanismo da alteridade que Emmanuel Levinas sublinha. Não se trata de refletir na solidão, mas na comunhão ética por vontade própria. Lembremos que, em cada eleição, nós escolhemos o que estamos dizendo à sociedade mato-grossense.
E Luciene Carvalho? O que será da Academia Mato-grossense de Letras com uma líder dessa natureza? Conservar a tradição e encetar a mudança. Antonio Candido entende o sistema literário como um processo dinâmico. Essa articulação é descrita imageticamente como uma transmissão da tocha entre corredores: uma tradição viva sem a qual não há literatura (e cultura) como fenômeno da civilização. Nossa nova presidente representa a tradição de uma cidade efervescente, de um estado ainda indiviso, mas nunca se entregou ao tradicionalismo. Faz parte de uma geração que se constrói a cada momento. A presente transmissão da presidência é mais um desses processos históricos com intenso dinamismo dos atores sociais.
A AML é o espaço da memória cultural. Não uma memória estática, mas de conceitos constantemente reincorporados/reinventados. O espaço já significa por si mesmo, mas pode projetar ainda mais. A história se materializa. Está em textos, ritos, monumentos, celebrações, objetos e outros suporte mnemônicos. Cristaliza experiências coletivas do passado constantemente revisitado. No entanto, não deixamos de refletir o presente e projetar o futuro.
Nossa Casa não só preserva a herança simbólica institucionalizada, resultado da afirmação dos grupos sociais que se coagularam com o tempo, mas está aberta para variados mundos. A construção da Instituição é também a nossa própria construção, a de cada um que compõe esta simbólica galeria. Penso que neste ato simbólico, revestido dos sentidos que cada um acredita e professa, há um rito que passa pelas sensibilidades de pessoas como as de Sueli Batista que vê a memória com os olhos do presente e de nossa futura presidente Luciene Carvalho que enxerga o presente com os olhos no futuro.
Concluo com Mia Couto, escritor moçambicano, já na esteira da nova gestão que ora se inicia: “é preciso que saibamos que fomos empobrecidos pela história. Mas nós fizemos parte dessa história, fomos também empobrecidos por nós próprios. A razão dos nossos atuais e futuros fracassos mora também dentro de nós. Mas a força de superarmos a nossa condição histórica também reside dentro de nós. Saberemos, como já soubemos antes, conquistar certezas de que somos produtores do nosso destino. Teemos mais e mais orgulho em sermos quem somos: construtores de um tempo e de um lugar onde nascemos todos os dias”.
Senhoras e senhores, muito obrigada!
Olga Maria Castrillon Mendes
Cadeira 15 - Da Academia Mato-Grossense de Letras